"Há dias em que as palavras não chegam - e em que o coração tenta ficar imóvel para não transbordar do nosso peito. Há dias em que a luz da rua não basta para nos fazer sentir vontade de enfrentar o mundo - e são dias em que apetece apenas um silêncio demorado que decidiu fazer uma pausa momentânea de tudo.
Há dias em que os sonhos parecem ser sonhos para uma vida diferente - e não a nossa - , quando são nossos, mesmo quando os queremos tanto, mesmo quando precisamos tanto deles para viver a vida que temos.
Há dias em que o reflexo que vemos no espelho parece vago, ausente, longínquo, obtuso, inerte e fugidio.
Há dias em que acordamos com uma angústia inexplicável dentro do peito. São dias em que temos vontade de gritar com o mundo, sem, na verdade, sabermos concretamente o que gritar. Mas a urgência queima-nos. A angústia alastra-se em nós. E precisamos desta revolta interna que, hoje, não aceita a vida como ela é - que, mais do que a vida não aceita sequer quem somos.
Há dias assim: em que as palavras não chegam - e em que o coração, no meio de tanto calor e de tanta urgência e de tanta rebelião interna, se esconde de nós próprios, incapaz de bater ao nosso ritmo."
Laura Almeida Azevedo